sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

A vida de Hildegard von Bingen – filme fascinante sobre uma mulher além de seu tempo


CINEMA

Para não perder o hábito vai aqui um post para quem prefere filmes a carnaval.

O indicado da vez (vi recentemente) chama-se Visão – sobre a vida de Hildegard von Bingen (2009), da diretora Margarethe von Trotta. Trata-se da história da abadessa do título (abadessa é a irmã superiora de um mosteiro ou convento). Apesar do tema aparentemente circunspecto, árido ou mesmo chato, começo por dizer que é um belíssimo filme, que, parece, não foi lançado no Brasil (não tem na 2001, por exemplo). Mas se encontra com camelôs e qualquer um pode baixar na internet nos dias de hoje, não é?


Barbara Sukowa: atuação magistral

A direção da alemã Margarethe Von Trotta é primorosa. A atriz Barbara Sukowa interpreta Hildegard von Bingen magistralmente. Do mesmo modo, Heino Ferch faz o irmão Volmer, apoiador e braço direito de Hildegard, de resto, numa obra em que a direção de atores é um dos pontos altos (o que para mim é fundamental em um filme). Luzes e sombras contrastam, a metaforizar a época.

Século XII

Hildegard von Bingen foi uma monja beneditina alemã nascida em Bermersheim vor der Höhe, em 1098, que morreu no Mosteiro de Rupertsberg em 1179. Além de religiosa e teóloga, foi escritora e compositora. Conhecia profundamente as plantas medicinais e desenvolveu métodos usando-as como médica informal. Tinha visões de criaturas (anjos?) e fatos místicos. Escreveu livros considerados avançados para sua época inspirados por essas visões, tratados sobre ciência natural, obras teológicas, entre as quais os estudiosos destacam Liber divinorum operum ("Livro das obras divinas"), sobre o prólogo do Evangelho de São João e sobre o livro do Gênesis. Legou uma obra grandiosa e por vezes hermética que está sendo cada vez mais estudada, a partir da segunda metade do século XX.

Uma mulher além do seu tempo

Filme foi rodado em mosteiros medievais
Como diz um texto em português publicado no Deutsche Welle e assinado por Carlos Albuquerque, “Ela aprendeu a olhar os lírios dos campos e a ver neles a presença divina que também levaria à cura de doenças. Para ela, o homem saudável estava em sintonia com Deus. Hildegard aliou a antiga medicina dos gregos, propagada por Galeno, à fé cristã. Para ela, micro e macrocosmo interagem lado a lado em sua percepção do homem e de Deus. Para honrar a Deus, o homem teria que interagir com seu meio-ambiente”. Segundo outro texto, este mais focado no filme (por Augusto Valente), do mesmo veículo alemão (entre os brasileiros não achei nada interessante), “Hoje, as farmácias vendem as ervas medicinais que foram pela primeira vez sistematicamente descritas e utilizadas por ela para fins medicinais”.

Porém, a influência dessa mulher incrível – que sofria de insistentes problemas de saúde e enxaquecas associados a sua visões – vai além do que produziu, pois, com sua personalidade marcante e agressiva, a abadessa impressiona por ter representado um papel de enorme significado e altamente atuante em plena Idade Média. Vejam, estamos falando do fim do século XI e início do XII. Hildegard von Bingen conseguiu realizar o impensável para uma mulher em plena escuridão de um mundo dominado por homens poderosos que, no entanto, segundo sua biografia, ela desafiava quando precisava atingir um objetivo.

Heino Ferch como o irmão Volmer
Segundo o filme de Margarethe Von Trotta, que pesquisou exaustivamente a biografia e a correspondência da abadessa, mesmo sendo hoje considerada “santa”, embora nunca oficializada como tal, Hildegard tinha atitudes e sentimentos bastante humanos (o que a distancia da pieguice de personalidades ou personagens perfeitos), como o ciúme e a possessividade, por exemplo em relação a sua noviça preferida.

Uma sequência do filme, rodado em mosteiros medievais, é emblemática da história e atuação dessa personalidade impressionante. As freiras recolhem ao mosteiro um homem cheio de feridas provocadas por autoflagelação. Ao recebê-lo, Hildegard lhe pergunta: “Você se flagelou?” O infeliz reponde: “Eu queria sofrer como ele sofreu por nós”. Ela devolve: “Aquele que mata a carne mata a alma que nele habita. Deus quer misericórdia, não sacrifícios”. Na belíssima cena, depois de indicar às irmãs a erva recomendada para tratamentos das horríveis feridas, ela diz ao enfermo: “A música também pode ajudar a curar suas feridas... e sua alma”. Segue-se a maravilhosa interpretação de uma freira ao violino, de uma música sacra composta por aquela que os mais simples – ao contrário da Igreja – entendem ser uma santa. Segundo os registros, ela previu sua morte para 17 de setembro de 1179, o que de fato ocorreu.

Não vi, mas fiquei muito curioso para assistir Rosa Luxemburgo, essa personagem tão interessante, com a mesma atriz no papel principal, dirigida por Von Trotta.

Trailer oficial:




Se quiser indicações sobre outros filmes “impróprios” para o carnaval, leia também:

Cinema para quem precisa - Indicações de filmes para um carnaval sem folia (2011)

Cinema para quem não pula carnaval (2010)

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